segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O lancinante sabor diuturno

Chesire cuidou de mim pelo resto da noite. Mas antes dela mesma começar, eu já me sentia como alguém grande, com pernas que alcançavam vários passos em um só. As cores platinavam em diferentes formas e gestos, com sua própria personalidade, cada uma. Eu podia escutar o som fino do silêncio e ver o sol nascendo lá ao fundo da paisagem que mudara e mudava a toda hora. Catalisadores de movimentos faziam modificar em câmera lenta acelerada toda e qualquer reação. Os tons de rosa variavam para violeta e vermelho, passeavam entre as cores os pingos de água azul e a relação entre coisa e forma dependia do que ela queria então dizer, algumas queriam falar e não sabiam que falar nada resolvia, não sabiam que de nada serviam, pois ali nada queriam dizer. Logo essas passavam a ser despercebidas por quem ali algo queria dizer. Os valores físicos não contavam e os segundos eram pigmentos absorvidos com destreza. Os episódios não tinham sinônimos e a escada tinha exatamente vinte e cinco degraus, eu podia contar-lhe todos em um minuto na mesma medida que os subia ou descia, tudo tinha o mesmo grau de entendimento e ao passar de nada outra vez ou sempre nada se sabia. Chesire me pôs nos braços ao clímax da noite. Chesire balançava pra lá e pra cá, sacudindo seus braços, feito água seca e quente avermelhada pelo sol que não tinha iluminando a parede escrita de café. Mas antes de eu mesma começar a achar o lancinante sabor diuturno da noite, as prateleiras seguravam copos e as maçanetas engoliam chaves, pois os carros sorriam, os mortos tinham dentes separados, as mochilas vigiavam e o flash mumificava as orelhas peroladas. E tudo estava normal a ponto de não mais ficar.

ap.

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sem coerência,